5 de julho de 2010

Piedade seu moço?


Amigos e amigas do Opinião e Crítica Brasil, a Copa do Mundo para o Brasil acabou, para ''nuestros hermanitos'' também, graças a Deus, acho.
É hora portanto,  de voltarmos a nossa realidade nua e crua, por vezes esquecida em épocas como esta.
O que passo a relatar serve  de aná
lise sobre como não deveríamos ser ou pelo menos ser, o mínimo possível.
A cena a que me refiro não é fictícia, é pura realidade e dói só de ver.
Parado em uma plataforma da estação Brás da CPTM, em pé estou a aguardar o cansativo e deságradavel trem que me transportará de volta aonde resido. São aproximadamente 22:30 horas de um sábado um pouco frio.
Fico olhando a minha volta as últimas obras do governo do estado que, só servem para campanha mesmo. Estação modernizada, plataformas diminuídas em números, alguns restos de trens parados sem serviço e o povo ali, em pé, a mercê da companhia. De fato, melhorou em muito, tem até trem moderno, mesclando com resto de sucata reformada por vezes, trens da década de 50 e por aí vai.
A companhia tem lá seus regulamentos o que é justo e coerente, como não ficar pregando religião dentro dos vagões e venda de produtos quaisquer. Salgados, chicletes, balas,  cerveja, água e drogas, claro.
São regras da companhia e tais regras, não funcionam. Não funcionam por causa do próprio usuário evidentemente.
Lá estou, como dissera antes, em pé tentando saborear um desses macarrões instantâneos quando vejo descer pela escadaria um senhor, uma senhora e mais quatro crianças, os quais devem ter algo em torno de 4 a 8 anos.
O que me parece ser o pai, tem uma aparência bem miserável, magro, moreno, pele queimada, face triste, mal vestido, com uma camiseta onde se lê '' Brasil, rumo ao hexa'', calça jeans bastante surrada e chinelos parcialmente destruídos.
O que parece ser a mãe, é uma senhora baixinha, morena, cabelos compridos e despontados, visivelmente sujos, face igualmente triste, com uma blusa vermelha ou vinho, uma saia de tecido qualquer azul e também de chinelos. Ambos não devem ter mais que 40 anos.
As crianças correm para lá e para cá, são todos meninos, usam camisetas, shorts e também chinelos. Estão felizes por estarem em uma ''grandeza'' como as dependências da companhia ferroviária. Olham para um trem parado, sem serviço e ficam admirados com o tamanho. Acho até graça.
Mas também fico tentando entender, o que leva um pai e mãe a estarem a quase 23:00 horas de um sábado, com 4 crianças, numa certa temperatura que não é para elas, pegando um trem? Sabe-se lá o que fazem da vida.
Em certo momento, vejo que uma das crianças fica olhando para mim, que já estava doido pela morosidade da companhia em não colocar um trem para rodar e percebo que a criança comenta com os outros 3 irmãos alguma coisa. Logo percebo que eles estão com fome. O que me olhava, se aproxima do pai e parece dizer a ele que quer comer o mesmo que eu estou comendo. O pai, logo o repreende com uma bronca, a mãe junta todos os filhos a barra de sua saia azul e lá ficam.
Os garotinhos me olham como que esperando uma resposta minha e não deu outra.
Como eu não havia nem dado a primeira garfada no meu macarrão, me dirijo até as crianças e cedo para eles. Eles se deliciam, quietinhos e sentados no chão da plataforma.
A mãe agradece e o pai meio que durão também faz o mesmo, tentando se justificar falando algumas coisas que eu nem quis ouvir.
Depois de quase meia hora, chega o trem e todos adentramos e tudo que quero é chegar logo em casa.
Do mesmo jeito que o trem chegou, ele saiu. Menos mal.
Assim que o trem sai da plataforma começa um ''festival'' de irregularidades por parte dos passageiros, drogas, água, chicletes e cerveja saem de todos os lados. Um imbecil ao meu lado, liga um irritante celular tocando funk carioca e isso vai comendo meus nervos até que o mesmo percebe minha ira e coloca o fone de ouvido. Era tão simples, mas ele tinha que ser chato.
A viagem prossegue e os metidos a vendedores de cerveja gritam como doidos de vagão em vagão para ver quem vende mais. No vagão onde estou, vai também a familia que já descrevera antes e vejo que o pai das crianças, com um sorriso amarelo na face, compra um latão da Brahma toda caracterizada para a Copa. O pai das crianças ri com o vendedor ao comentar a derrota da seleção para a Holanda e se orgulha da derrota da Argentina. Tudo besteira, tudo patético..
As minhas reflexões não param e me questiono muito, me irrito muito. Como a mídia, empresas de vários segmentos, governo,  justiça podem permitir a destruição da vida das pessoas, prendendo-as em mundo explorador, covarde e sem moral?
Como pode um pai negar ao seu filho, um simples macarrão instantâneo e preferir tomar um cerveja?
A vida em comum, calcada no respeito, na proteção, na busca por coisas lícitas e boas não existem mais. As famílias se perderam.
Fico olhando aquele pai e tenho nojo de sua atitude, começo a repudiá-lo em meus pensamentos, são escolhas e nada além.
A mãe nada faz, nada comenta, fica com as crianças a sua volta abraçados a ela e tentam dormir um pouco.
A viagem prossegue, chata e irritante com vários trabalhadores, casais de namorados, gente que tenta dormir, gente que vem de algum passeio, gente que gosta de se aparecer conversando aos berros e gente que nada faz de útil na vida, a não ser usar drogas pelos vagões e sair gritando coisas sem nexo.
Fecho os olhos e também tento descansar meu cérebro, domingo tem mais.
Como não há nada a fazer, o jeito é ficar quieto e chegar logo em casa, tomar um banho, comer algo e ir dormir.
A vida segue, cada qual com sua escolha, seus temores e dores, cada qual com sua história.